No dia 6 de janeiro de 2021, o prefeito em exercício Waldir Novais sancionou a Lei 3.362 que instituiu o 9 de maio como Dia Municipal da Capoeira e do Capoeirista em Unaí.
Como o Brasil estava no momento mais agudo da pandemia, o assunto ficou relegado somente à Câmara Municipal, já que a iniciativa partiu da vereadora Andréa Machado, inspirada pelo capoeirista Lucas Adjuto (mestre de capoeira, professor de capoeira, capoeirista e referência unaiense para o setor).
Mais recentemente, com o arrefecimento da covid-19 e a liberação para eventos, a Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (Sectur) e os nove grupos de capoeira unaienses preparam a celebração da data, evento previsto para esta segunda, 9/5, na UAI Hermes Martins, a partir das 18h.
A secretária Luciana Navarro conta que estão registrando em vídeo "o cenário" da capoeira em Unaí, os professores, as academias, enfim, um registro de quem é quem no meio, de quem luta para preservar a atividade e reforçar a importância que a capoeira tem para a cultura, a educação e a arte brasileiras. Essa produção audiovisual será exibida durante o evento comemorativo.
Os registros produzidos, segundo Luciana Navarro, terão cópias na Biblioteca Pública Municipal e no Museu Municipal. E serão os primeiros registros a compor os documentos que serão enviados para o Estado, a fim de que o Dia da Capoeira e do Capoeirista seja inserido no calendário oficial do município.
Na sequência, a ideia é inventariar e tombar (reconhecimento oficial para fins de preservação) a capoeira unaiense, como patrimônio imaterial, em nível municipal e estadual. Luciana lembra que a capoeira já é tombada nacionalmente como patrimônio do Brasil.
"Quando é feito o tombamento, há um reconhecimento oficial, uma salvaguarda, uma preocupação do município em proteger o bem ou patrimônio tombado", explica a secretária de Cultura.
"Inclusive, esse reconhecimento é um facilitador para captação de recursos públicos (disponíveis em fundos culturais)", ela complementa.
Para fazer jus aos recursos, no entanto, o grupo interessado deve estar legalmente constituído, com tudo em dia, e participar de concorrência pública para avaliação dos projetos propostos.
POR QUE 9 DE MAIO?
A data para a capoeira em Unaí reveste-se de um simbolismo especial, por ser aniversário de nascimento do unaiense mestre Zulu, em 1946. Zulu terá um momento de fala, à tarde, na Câmara Municipal e participará da celebração à noite, na UAI.
"Não é homenagem póstuma, é homenagem em vida", ressalta Lucas Adjuto. Mestre Zulu foi o primeiro capoeirista que desenvolveu a atividade em Unaí. O pioneiro da capoeira unaiense morou no bairro Barroca. Ensinou a capoeira para muitos unaienses.
Mestre Zulu mora no Distrito Federal, onde fundou o grupo Beribazu em 1972, no Colégio Agrícola de Brasília. Lá formou muitos unaienses na "arte-luta" da capoeira. Mas não só.
Lucas Adjuto conta que o grupo tem uma ligação umbilical com o estudo e a pesquisa, já que muitos dos membros formados no Beribazu estão dentro da Universidade de Brasília (UnB). "Eles desenvolvem pesquisas sobre a capoeira, em nível de mestrado e doutorado", revela.
Formado em educação física, Lucas conta como a capoeira transformou a carreira do professor e coordenador do curso, à época, André Luiz Teixeira Reis, também integrante do grupo Beribazu, com doutorado e autor de livros que tiveram como base pesquisas ligadas à capoeira.
"Ele era professor de matemática na UnB, começou a praticar a capoeira no grupo, buscou a formação em educação física e hoje é doutor em exercício e saúde pela Universidade de Bristol, na Inglaterra. "A capoeira foi seu campo de pesquisas", ressalta Lucas.
No ensino superior, o próprio Lucas Adjuto lançou mão da capoeira para fundamentar suas pesquisas bibliográficas e produções científicas em nível de graduação e pós-graduação.
Além da teoria, ele conta 30 anos de prática no exercício da capoeira, 25 dos quais dedicados à academia Senzala, onde tem 120 alunos (entre pagantes e bolsistas de projeto) e trabalha das 6h às 22h. "Eu vivo a capoeira e da capoeira", conta, orgulhoso.
Iniciado como aluno do mestre Luna (o Baiano), em Unaí, no início da década de 1990, Lucas receberá sua corda vermelha no mês de agosto próximo, em cerimônia a ser realizada em Brasília. É a última graduação na capoeira, comparada à faixa preta no caratê e taikwondo e faixa vermelha no jiu-jítsu.
"Para conseguir a corda vermelha, é necessária uma vida inteira dedicada à capoeira", avalia o mestre Lucas, único com tal graduação em atividade em Unaí.
CAPOEIRA É UM MISTO DE ARTE, CANTO, DANÇA E LUTA, QUE VAI EVOLUINDO
Estudioso da matéria, Lucas Adjuto conta que os primeiros relatos de capoeira no Brasil remontam ao ano de 1620. A capoeira tem raízes africanas, mas "para jogar lenha na fogueira", Lucas diz que alguns autores questionam essa origem, e atribuem aos indígenas a criação da arte-dança-luta. "Há relatos de negros africanos e indígenas praticando a capoeira", diz.
Nas origens, destacavam-se o atabaque (instrumento de percussão), a palma de mão (com duas madeirinhas), o canto e a dança da zebra (n'golo). Tudo feito em círculo. Já era o prenúncio da atual "roda de capoeira".
Com o tempo, os brasileiros foram acrescentando novos elementos à capoeira (como o berimbau, novos instrumentos, novos cantos, acrobacias com saltos mortais, uma ginga), enfim virou outra "coisa".
"A ponto de o mestre Pastinha fazer uma viagem à África para apresentação de capoeira naquele continente e não encontrar nada parecido com o que era praticado no Brasil", assinala Lucas, para quem "a capoeira está em evolução constante".
A capoeira já se espalhou por 170 países do mundo, disseminada em suas dimensões histórica, cultural, educativa e esportiva.